“Quanta tristeza um homem pode ter que suportar?
Tanto quanto um rio de água nascente fluindo para o leste.”
— Li Yu, o último Imperador da Dinastia Tang do Sul, deposto em 975.
Escuridão, silêncio e lembranças. Não param de me atormentar. Se repetem constantemente, como um conto trágico e sem fim. Sem mudanças, sem futuro.
Não enxergo nada, porém, vejo tudo. Contemplo o antes, o agora e o depois. Assim, concluo: sou o arquiteto de minha própria ruína.
Estou sufocando, no entanto, ainda respiro e permaneço de joelhos, me recusando a cair. Estou chorando e as lágrimas nunca param de descer, manchando meu rosto. Seguro ossos, que se transformam em pó e escorrem, como areia, por entre dedos tortos e feridos. Eles sangram. Dói muito, na carne e na alma.
Estou tremendo. Não consigo evitar que escapem de mim. E se vão. Já se foram, há muito, muito tempo.
Escuridão, silêncio e lembranças.
Estou gritando, mas ninguém pode me ouvir. Ninguém pode me alcançar.
Estou morrendo lentamente. Ainda assim, tento me levantar. Meu corpo não se dá por vencido.
Por quê?
Eu me perdi. Todos sabem onde me encontrar, mas ninguém virá até mim.
As lágrimas, o sangue e o pó criam uma lama grossa, pegajosa, firme, e se fundem. Parece barro, talvez argila. Pego um punhado e começo a modelar. Faço um pingente. É a forma do lótus se abrindo. Guardo comigo e não solto. Não deixarei ir.
Escuridão, silêncio e lembranças.
Minha mão direita tocou a lua, e a esquerda derrubou as estrelas. Não pretendo me livrar dessas correntes. Não poderia mesmo que lutasse por isso.
Minha mão direita colheu flores, a esquerda fechou a porta. As memórias foram gravadas em mim, como uma pintura — escritas em meu pulso, como um poema triste.
Não enxergo nada, porém, vejo tudo. Contemplo o antes, o agora e o depois.
Escuridão, silêncio e lembranças.
Eu destruiria mil mundos, derrubaria mil céus e secaria mil mares. Mas, se para isso, eu tivesse que…
De repente, luz. É pequena, fraca, quase imperceptível. Estico o braço e tento tocá-la. Não consigo.
Estou sufocando e chorando, tremendo e gritando, de joelhos… morrendo.
Minha mão direita segura o pingente, a esquerda busca apoio.
Estou de pé.
Escuridão, silêncio e lembranças.
Ainda há alguém esperando por mim?
Sim, eu me recordo… Aquela imagem me invade, como uma onda implacável.
Em meus sonhos perturbados, te guardei sempre comigo.