

Cilene @Cilene
Feroz
Não se pode amar um leão sem ajoelhar-se diante da fome
Amar um leão é despir-se com olhos cravados nos músculos que anunciam a violência
É sentir o hálito quente no pescoço exposto, é pedir a boca que dilacera
Amar um leão é estremecer com o faro lançado entre as coxas como quem sabe onde a alma geme
Não se ama um leão sem a necessidade das garras, das presas e de saciar o ventre aberto
Amar um leão é sentir prazer na vertigem da condenação dos seus olhos
Amar um leão é esperar de quatro na mata escura sem se decidir se hoje será a leoa ou a corsa
Na selva da pele o desejo é uma fera sem jaula.

Cilene @Cilene
Lua de Sangue
Se te despisse com os lábios e te vestisse com desejo, de que cor seria o prazer?
Lua, és tu vermelha de timidez ou sangras os cortes dos que se amam sem poder?

Cilene @Cilene
Luz dos meus olhos
Passo os dias e as tardes te procurando
À noite, ainda estou calculando
Quantas aeronaves continuam pousando
Sem você chegar
O escuro é ainda um grande amigo
Escondo nos dias meus
A luz dos olhos teus
Sinto sua falta e ninguém pode ver

Cilene @Cilene
Adiantei o pedido: uma água com gás, dois copos com limão fatiado e gelo.
Ele chegou. Pedi dois expressos sem açúcar.
Nos cumprimentamos como dois cotovelos adolescentes: ossudos e desajeitados.
Meu rosto quase ofereceu a boca. O hábito, às vezes, é mais forte do que a vontade.
Ele olhou para os nossos copos com olhos tristes.
- Você está bem? - dissemos ao mesmo tempo e sorrimos olhando para baixo, sem mostrar os dentes.
- Você primeiro. - Meneou com a cabeça.
- Tudo indo. É estranho. - Respondi.
- Eu também, muito estranho. - Ele tomou a vez.
Fiquei em silêncio. Tomei a água toda. Troquei a cruzada de pernas.
Coloquei a pasta com os papéis sobre a mesa. Peguei uma caneta na minha bolsa e levei a mão ao papel.
Ele a segurou. Olhei para nossas mãos juntas, senti o calor tão familiar… apertei a palma de sua mão com as pontas dos meus dedos, olhando para ele. Olhei de volta para as mãos, balancei a cabeça negativamente, com pesar.
Assinei e passei para ele o papel e a caneta.
Ele assinou olhando dentro dos meus olhos, sem olhar para o papel.
Não precisei piscar para as lágrimas rolarem dos meus olhos.
Levantei.
- Obrigada. Beijei-o na bochecha demoradamente.
- Já vai? Não tomou seu café! Ele alertou-me.
- Esfriou.
Eu saí. Olhando para trás, ele me assistia ir embora. Pensei que, assim como o café, se a gente deixar, o amor também esfria.

Cilene @Cilene
Conto inspirado em um dos contos de Delta de Vênus

Cilene @Cilene
Insatisfação
Faz tempo que não escrevo safadezas
Também elas não me satisfazem
A carne que tem memória do seu feitiço
Ou a memória que tem o cheiro da sua carne?
Não sei…
Sei apenas que existem esses dias que existo menos
subjugada pelos meus desejos
Eles protestam o que querem e só isso poderá satisfaze-los
O que quero não posso me dar
Tudo grita dentro de mim
Tudo calo
Você não vê?
Parece que vou rachar ao meio
Só por te querer