Uma semana se passou, desde que fora deixado ali, no início era uma comichão, lenta e sossegada, esticava para tentar crescer, mas o progresso era lento, seus membros formigavam, ou melhor analogicamente falando, lesmigavam, 🐌, de tão lento que era seu desenvolvimento, não tinha como ela saber, era sua primeira vida, não havia passado por aquilo antes, tudo era novidade, nem sabia o que era nem quem era, agia por instinto, vivia por instinto, enfim, estava a mercê do instinto.
Não enxergava nada, 🙈, mas não sabia se era apenas escuridão ou se não tinha visão mesmo 👁️, apenas sentia que era viva, de certa forma respirava, recebia toda alimentação que necessitava, não sabia de onde vinha, mas recebia, nada lhe faltava, se sentia muito mimada e aconchegada. Não havia obrigações, não havia deveres, não fazia nada, apenas vivia. Não sabia o que era se mandada, não sabia o que era ser xingada, o que ser surrada, mas também, não sabia o que era ser notada, ser elogiada, ser alguma coisa, apenas sentia que existia, será que estava só, até aquele momento não havia interagido com nada nem ninguém, qualquer coisa que fosse, a não ser o próprio local em que estava.
Sobre o local onde estava, era aconchegante, não muito apertado, podia se esticar, um pouco, mas podia. Sentia que com o passar do tempo ganhava mais espaço, que seus membros avançavam entre as paredes do seu invólucro. Com relação ao ambiente, as vezes sentia um calorzinho, depois esfriava, voltava a esquentar e esfriava novamente, sempre alternando, percebia que quando esquentava havia diversos sons que vinha do lado de fora, e quando esfriava, tudo era mais calmo, e os sons se tornavam diferente, ainda não entedia, mas percebeu que era um ciclo padrão e acostumou-se com a rotina, pois desconhecia o significado de dia e noite. Percebeu também, que o calor a deixava mais exausta, mas que por encanto, logo o ambiente umedecia, revigorando suas forças, lhe dando upgrade de energia por dentro que fazia que seu desenvolvimento acelerasse, não sabia explicar por quê, mas era uma sensação muito agradável, e se tornou quase um vício, tanto que ansiava a chegada destes momentos, já não podia viver sem isso.
Não havia noção do seu corpo, apenas sentia que existia, um fio de vida, mas existia, podia sentir, seu destino, o que se tornaria, ainda incerto, como diz o ditado, “na natureza nada se cria, tudo se transforma”, sentia que seu corpo estava em transformação, começava a ganhar mais consistências, se sentia mais firme, ganhando mais peso, talvez ganhando alguns músculos 💪 e tomando forma.
Seu nome? Bem, ainda não temos um nome para ela, pois sozinha no mundo, não haveria necessidade de ser chamada por um nome, afinal, qual o sentido de se ter um nome se ninguém vai te chamar por ele? 🤷♂️. Bom, para nós, vamos a apelidar, carinhosamente de Áster. Sim, Áster é um bom nome e condiz com sua natureza. 🥰.
A medida que o tempo passa, naturalmente, como tem que ser, Áster vai se desenvolvendo, seu corpo vai ganhando mais volume e formas, mas algo está diferente, pelas suas entranhas ela sente a presença de outros seres, consegue sentir que existem outras vidas pulsando em algum lugar não muito distante, na verdade, bem próximo a ela. Sente um ponta de felicidade, ora, não está sozinha no mundo, será que vai chegar o momento de encontrar ou fazer contato com outro ser vivo além de si própria? Se questiona e fica quietinha tentando captar mais sinais, e até quem sabe estabelecer uma comunicação por eletrofisiologia. Tenta, tenta e tenta, mas nada, exausta, resolve descansar, quem sabe quando estiver mais crescidinha.
Agora, Áster, já tem uma noção dos ciclos dos dias, ela percebeu que a rotina do esfria e esquenta do seu lar, corresponde ao passar dos dias, embora não tenha noção de quanto tempo já tenha se passado desde que tomou consciência de sua existência.
Neste momento ela sabe que é noite, pois está frio e úmido, o silêncio reina lá fora, vez ou outra escuta um grilar que vem de longe, não conseguia entender o significado daquele som, tentava estabelecer novamente uma conexão através de seus poros, mas nada, ao invés disso, sente vibrações bem próximas, e ruídos silenciosos e insistente, alguma coisa se aproxima, lento, mas está próximo, seus poros se arrepiam, ela fica quietinha, imóvel, há um misto de medo e ansiedade, nunca antes havia tido estas sensações, seu estômago começou a embrulhar. A medida que o som ficava mais próximo e as vibrações mais forte, Áster se encolhia, também passou a sentir calafrios, dor no peito, uma sensação de engasgo e enjoo, não tardou, veio tontura e falta de ar – estava em pânico 🫨 – era primeira vez na vida que sentia a sensação de perigo ⚠️, estava quase desmaiando, mas a expectativa, a curiosidade a manteve firme, com todos os sentidos ligados, quieta, em pânico, mas ligados.👀
Já fazia algumas horas naquela situação, ela queria emitir algum som, mas não conseguia, queria perguntar o quê, ou quem estava ali, e o quê queria com ela, mas não tinha fala, não tinha voz, não tinha como se comunicar, então só aguardou, e aguardou, pacientemente assustada, mas aguardou. Acabou se acostumando com a vibração ao seu redor e o som, que era monótono, contínuo, mas monótono, parecia alguém sem dente mastigando um pedaço de pão d’água seco.🥖
Sentiu que as estruturas a sua volta começaram a se desmanchar e desmoronar, como se alguém estivesse pressionando as paredes com um tatuzão, ela sentia pressão da parede ao seu redor contra o seu corpo, pânico voltou, agora o encontro era iminente, logo ela ficaria de frente a frente com o invasor, era inevitável.
Áster sentiu o primeiro um toque, na verdade mais parecia umas cócegas, e depois algo úmido a tocou, como se fosse um beijo, a criatura trocou em algum lugar do seu corpo mas logo parou, ficou imóvel, a criatura tentou de novo, mas desta vez recuou, e recomeçou a se mexer, mas agora não foi direto em direção do corpo de Áster, estava roçando ao seu lado, como se estivesse circulando-a, ela não sabia o que aquela estranha criatura queria com ela, mas nada podia fazer em sua defesa, apenas esperar e aceitar seu destino.
Assim como a criatura foi lenta na chegada, era lento também, a tormenta daquele momento, Áster começou sentir, a medida que aumentava a área de contato com a criatura, um misto de nojo e repulsa, a criatura se mexia em movimentos de vai e vem bem colado ao corpo dela, abrindo espaços entre o corpo de Áster e as paredes do lugar, a criatura ia abrindo espaço, estava apertado, mas era insistente, seu corpo era roliço e escorregadio, ainda parecia que tinha uma gosma nojenta sobre sua pele gelada, mas o pior, era o som a que a criatura emitia, algo que soava como “groch, groch, groch….”
Aquelas horas pareciam interminável, mas ela percebeu que a criatura já estava se afastando dela, pois o a primeira parte que tocou em Áster, de onde eram emitidos os grunhidos, a cabeça, calculou ela, parecia que já estava seguindo para outra direção, os sons já estavam mais abafados, mas ainda podia sentir o corpo da criatura se movendo ao seu lado, bem rente ao seu corpo, foi então que ela percebeu que a criatura não tinha interesse nela, que apenas se esbarrou com ela, pois talvez estivesse no caminho, esses pensamento lhe trouxe sossego, passando toda a ansiedade e preocupação com aquele encontro misterioso.
Ainda sem saber direito o que foi exatamente que aconteceu, mas já tinha uma certeza, aquilo estava prestes a terminar, pois sentia que o corpo da criatura estava chegado ao final, podia sentir o contato das últimas partes e seus corpos já estavam se afastando, pode sentir também, uma folga, um espaço vazio por onde a criatura passou, com essa folga ela conseguia se espicha e mover as membranas sobre sua pele, já estava mais confortável.
A criatura passou, mas Áster ainda podia sentir resto da gosma pegajosa escorregando junto ao seu corpo, e um rastro de substância, resquício do contato com o visitante, sentiu-se enojada 🤢, mas aliviada com o término do tormento, mais ainda, poque não sofrera nenhuma espécie de dor, enfim sobreviveu ao sentimento de angústia, ansiedade, medo, expectativa e agora de alívio.
Exausta e cansada da tensão causada diante daquela aventura, naquele dia, ela adormeceu profundamente😴, o que era estranho, pois uma pessoa, provavelmente ficaria mais agitada e excitada naquela situação, poderia inclusive sofre de pesadelo e sobressaltos durante o sono, mas com a nossa personagem parece que foi diferente, pois conseguiu relaxar, descansar e quando acordou, sentia-se disposta, revigorada, energizada, teve mais consciência de todo seu corpo, sentiu-o com mais definição e seus músculos mais rígidos, parecia que recebeu um força extra, ficou pensando sobre isso, o quê o acontecimento anterior teria ver com isso? Será que teria? 🤔.
Refletindo sobre isso, percebeu que seu corpo todo funcionava como um captador de alimento, que era através das membranas sobre sua pele que captava substâncias para subsistir e se desenvolver, aspirava gás carbônico e liberava oxigênio através das ramificações do seu corpo para a atmosfera durante o dia e à noite o processo era inverso, as substâncias que captava estavam ao seu redor, espalhadas das mais diversas formas, água, nutrientes, energia, calorias, sais minerais, proteínas, além de outros necessários para seu desenvolvimento, pensando nisso, lembro que a criatura que passou por ela deixou para traz restos e excrementos 💩, eca, sentiu mais uma vez nojo, e náusea, era como se fosse - fazendo uma analogia - a sensação de uma pessoa que come sushi 🍣 pela primeira vez.
Com o passar do tempo, ela começou a sentir com mais intensidade a presença de outros seres através ondas eletrofisiológicas, sentia que seu corpo ia além do que imaginava, que estava conectada com outras partes, mas que eram autônomas e independentes, mas agora que estava mais desenvolvida, a conexão era mais forte, acreditando nisso começou a emitir sinais eletrofísicos, e para seu espanto, os sinais começaram a retornar com resposta, ficou emocionada, estava finalmente conseguindo fazer contato com outros seres.