Descrição
"A memória tem modos de tratar o tempo que ainda escapam à compreensão dos físicos. Pode a memória elencar o começo de um sentimento não no primeiríssimo evento de uma sucessão cronológica, mas, entre os primeiros, naquele que despertou o sentimento com mais força. Pode bem ser verdade que já existia, engatinhava, iniciava os sonhos ou pesadelos com sua maturidade, mas sequer tinha nome. Ainda não verbalizado, era como se não tivesse começado. Bem se mostra aqui outro critério boníssimo para marcar o início, um que concilie o tempo dos físicos e o tempo da memória e da experiência interior humana: a primeira vez em que o sentimento deu-se de forma clara, distinta e intensa o bastante para exigir ser colocado em palavras. Depois de dizê-las e deixá-las soar em todo o seu significado discursivo, não há mais volta. O sentimento está inaugurado, mesmo que já fermentasse há tempos, numa nefasta gravidez, apenas aguardando o momento de ser parido. No parto, o choro, o grito, o anúncio do início da vida que nunca quis nem pôde querer nascer. Eu, ainda com 12 anos, na penumbra da vida e da madrugada, sem conseguir enxergar nada com muito discernimento, ergui-me com algo dentro de mim o qual ainda não sabia nomear, mas sabia que se injuriava pelo que chegava aos meus angustiados ouvidos. Olhei para a cama ao lado, onde estava meu irmão gêmeo, a quilômetros de distância de meu choro confuso e desesperado por expressão. Era a hora do parto:
— Eu te odeio!"
"Fratri" é um romance em prosa poética que traz as memórias de um narrador cujas vida e sanidade foram arruinadas por seu irmão gêmeo, quem o ensinou desde muito cedo o significado da palavra ódio. 240 páginas.
Fratri - romance em prosa poética
