Pela centésima vez, o menino empurrava os óculos de volta ao lugar, pois eles insistiam em escorregar pelo nariz suado.
Esse gesto o fazia reduzir a velocidade da corrida e ouvir, cada vez mais próximos, os pesados passos atrás de si.
Não fora uma boa ideia permanecer no colégio após as aulas para ler na biblioteca, onde os brutamontes o cercaram.
Mais por pânico do que por habilidade, conseguira saltar por uma das janelas e agora corria pelos corredores esvaziados pelo feriado prolongado que começaria no dia seguinte.
— Vou fazer você comer esses óculos, seu nerdzinho de merda! — gritou alguém atrás.
Os gritos de ameaça vinham do garoto novo no colégio, um valentão chamado Lucas, agora apelidado de Lucão, que, na semana em que estava ali, já havia intimidado vários colegas menores, tomado seus lanches e até dinheiro.
Tim tivera a coragem de se recusar a passar cola durante uma prova e agora era o alvo de sua fúria.
E o valentão não vinha sozinho. As únicas amizades que fizera foram com dois garotos encrenqueiros já conhecidos no colégio — e eram eles que vinham junto, fazendo coro nas ameaças.
O menino desceu escadas, contornou pilastras, atravessou corredores e, ao dobrar um deles, se viu em um beco sem saída. De um dos lados e ao fundo havia a parede de um dos prédios escolares. O outro lado era aberto, mas o muro era alto demais para alguém de sua estatura.
Tremendo, encolheu-se junto à parede dos fundos.
Logo três sombras surgiram na outra ponta do estreito corredor e vieram em sua direção, agora caminhando sem pressa, ao verem que sua vítima estava encurralada.
— Agora você vai aprender a não me desobedecer, seu bostinha — rosnou Lucão.
O pequeno se encolheu mais, chorando baixinho, mas, de repente, silenciou, aprumou a postura e uma expressão de alívio surgiu em seu rosto vermelho.
Os três atacantes se entreolharam, confusos. Foi quando notaram, refletido nas lentes embaçadas dos óculos do menino, alguém que se aproximava pelo corredor atrás deles.
Viraram-se e deram de cara com um garoto que caminhava resoluto em sua direção.
— Quem é esse cara? — perguntou Lucão, furioso.
— Ferrou! — gemeu um dos outros.
— E… ele já voltou da suspensão? — guinchou o outro, com voz fina.
Sem mais delongas, os dois saltaram o muro e desapareceram.
O brutamonte restante, no entanto, não se intimidou. O garoto que chegara era alto e forte, mas ele também era.
— Quem é você? Vai embora, cara, ou vai sobrar pra você tamb…
Não terminou a frase. Em três passos rápidos, o outro já estava em cima dele e lhe desferiu um gancho no estômago, fazendo-o se curvar sem fôlego. Em seguida, um joelho subiu e acertou em cheio seu rosto.
Tombou para trás. Tentou se levantar, mas um chute no peito o lançou ao chão.
O agressor ajoelhou-se sobre ele, prendendo-o ao piso. Agarrou o colarinho com a mão esquerda e, com a direita, começou a desferir repetidamente murros rápidos.
Aturdido com a dor, Lucão percebeu, apavorado, que o outro não tinha pressa em nocauteá-lo — os golpes, embora dolorosos, não eram fortes o suficiente para isso. O recém-chegado queria surrá-lo. Muito. Queria fazê-lo sofrer.
Com a garganta e o nariz inundados de sangue e sentindo dois dentes rolando dentro da boca, conseguiu grunhir:
— Pa… para! Pelo amor… de Deus! Pa…
O outro parou com o punho já erguido e o encarou, a fúria incandescendo seus olhos castanhos.
Depois de segundos — que pareceram horas para o caído — o rapaz grande agarrou com força também a gola de sua camiseta e, quase o estrangulando, puxou-o para perto do rosto:
— Preste muita atenção — disse com voz fria. — Deixe a garotada do colégio em paz, entendeu? Ou vou te dar outra surra — e não vou pegar leve como desta vez.
— E… eu vou mu… mudar de colégio — balbuciou o espancado.
O outro apertou ainda mais sua gola:
— Não, você não vai! Se mudar, eu vou atrás de você até o inferno! Vai ficar aqui e aprender a ser gente, entendeu?
Sem conseguir falar, o ex-valentão apenas meneou a cabeça afirmativamente.
O rapaz cuspiu em seu rosto e o largou. Lucão se enrolou em posição fetal no chão, enquanto lágrimas e sangue escorriam para o piso.
— Venha, Tim.
O menino atendeu feliz ao chamado de seu salvador e, ao passar pelo caído, ainda lhe aplicou um chute nas costelas.
O rapaz alto e forte sorriu e deu tapinhas nas costas do garotinho.
Enquanto se afastavam, Lucão, vencido e humilhado, começou a se mexer, apoiando uma das mãos no chão, tentando se levantar.
Nunca havia apanhado daquele jeito em sua vida.
— Ah, que falta de educação a minha! — exclamou o outro, voltando.
O caído se encolheu novamente, mas esqueceu de recolher o braço. O outro pisou em sua mão e a esmagou sob o tênis, enquanto se abaixava:
— Você perguntou quem sou eu. Me chamo Daniel — disse. Lucão ergueu o rosto, contorcido de dor, e viu, dentro dos olhos do outro, uma chama amarela bruxuleante. — E pode ter certeza: não será um prazer para você ter me conhecido.
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